Durante a semana parei para refletir um pouco
nos personagens de séries e filmes que eu gosto muito. Pensei bastante. Meditei
um pouco sobre o meu filme preferido (Na Natureza Selvagem) e em duas de minhas
séries preferidas (One Tree Hill e Gilmore Girls). O que eu pude notar que
todos têm em comum é um protagonista que gosta muito de ler. O Chris, o Lucas e
a Rory. Existe uma lista contendo todos os livros citados pela Rory em Gilmore
Girls e eu tenho salvo alguns livros citados pelo Lucas em One Tree Hill e pelo
Chris no filme. Estou numa fase da vida em que quero investir muito no meu
crescimento pessoal, então decidi escolher alguns livros das referidas listas
que eu acho que irá me ajudar neste investimento e lê-los. O primeiro livro escolhido
foi “O Chamado Selvagem”, de Jack London. Então bora lá falar sobre
ele.
O Chamado Selvagem foi escrito em 1903 por
Jack London ainda jovem, com seus vinte e sete anos. No livro vamos ter como
protagonista um cão domesticado chamado Buck, originado por um cruzamento de um
São Bernardo e uma Pastora, que foi domesticado em uma grande casa chamada de a
Casa do juiz Miller. Em um triste dia quando não tinha ninguém em casa o
jardineiro da casa traiu todos vendendo Buck por causa de um vício: apostas em
loterias chinesas.
Após ser vendido, Buck passou por vários maus-tratos.
Apanhou muito durante toda a viagem até chegar ao local onde passaria a
trabalhar arduamente puxando trenós. Até o momento Buck “confiava nos homens e
dava-lhes crédito por uma sabedoria que ultrapassava a sua” (página 7). A
partir de então acompanhamos a trajetória de Buck do seu estado domesticado
para o seu estado natural. Nos primeiros dias de trabalho, como é de se
esperar, houve muita dificuldade para Buck se adaptar ao novo sistema, mas com
pouco tempo o trabalho já era realizado por ele facilmente e com uma
competência animal incrível.
“O respeito pela propriedade particular e
pelos sentimentos pessoais ficava muito bem nas regiões quentes do sul, sob a
lei do amor e da camaradagem, mas nas terras do norte, sob a lei do porrete e
das presas, quem quer que tomasse essas coisas em consideração era um tolo, e
se observasse um comportamento ético, não conseguiria sobreviver.”
Neste novo modo de vida rodeado por vários
cães ele precisava conquistar seu espaço, mas como todos os novatos ele teve
suas dificuldades, pois começou os conflitos de convivência
Hierarquia-Disputa-Liderança. Não demorou muito para que Buck tivesse o respeito
de outros cães e o reconhecimento de seus novos donos devido à sua excelência no
trabalho. Por mais que o cão adaptava-se rápido ao novo modo de vida,
geralmente ele pensava na vida antiga que agora parecia distante, quase irreal
e aos poucos essas lembranças iam se dissipando no avançar de sua selvageria.
As lembranças das porretadas após sua venda deixava Buck um tanto cauteloso com
os seres humanos e até mesmo com os outros cães.
Buck teve diferentes donos durante esta
nova experiência de vida devido a vários fatores. E em cada lugar ele descobria
algo novo e ao mesmo tempo antigo dentro dele mesmo, como se essa coisa já
existisse ali e ele só não tivesse percebido ainda. No avançar dos dias e das
situações Buck foi percebendo que havia um chamado selvagem e algo dentro dele
respondia muito bem a este chamado e ele precisava ir de encontro. O afeto
pelos seres humanos não existia mais no coração de Buck, exceto por apenas uma
pessoa que ele amava intensamente, mas algumas circunstâncias delicadas ditarão
um futuro bem diferente do que Buck imaginava enquanto vivia na Casa do Juiz
Miller. O penúltimo capítulo do livro “Por amor de um homem”, que vai falar
dessa relação humana-animal é perfeito. Eu não consigo transmitir tudo o que
senti lendo ele.
A sensação que eu tinha ao ler este livro é
que eu estava lendo a mim mesmo naquelas entrelinhas, como se o livro fosse uma
espécie de espelho. Isso já aconteceu com alguns outros livros, com este, no
entanto foi de uma forma mais forte. Eu me perguntava o tempo todo o que é
necessário acontecer de fato conosco para que cheguemos ao limite e encontremos
dentro de nós o homem natural, contrário à civilização, às religiões e às vãs
filosofias que construímos para viver em uma sociedade confortável.
“Ele não passou a roubar por prazer, mas
para atender ao clamor de seu estômago. Ele não furtava abertamente, mas
subtraía secreta e ardilosamente, por respeitar a nova lei do porrete e das
presas. Em resumo, as coisas que fazia eram feitas porque era mais fácil e mais
proveitoso agir assim que de outra maneira.”
Acredito que Buck jamais imaginaria ser forte como foi de fato e isso é
que nos remete a pensar em nós mesmos. Onde é o nosso limite? Até onde eu posso
ir para continuar vivendo sendo esta mesma pessoa? Será que é saudável viver
sendo a mesma pessoa durante toda a vida sem descobrir várias coisas que existe
dentro de nós? Até onde eu acho que posso suportar? Trabalho com criação de
insetos em laboratórios há três anos e algo que não pude deixar de perceber
neles é que para um inseto recém-chegado do campo sobreviver bem no laboratório
é necessário uma série de especializações, caso contrário, devido ao ambiente
diferente eles não resistem. No caso de nós, humanos, essas especializações não
existem, precisamos de fato buscar forças no homem natural que existe dentro de
nós se queremos sobreviver às mudanças.
Ainda existem várias coisas que eu gostaria de abordar sobre este livro
incrível, mas o texto já está ficando longo. Recomendo muito a leitura e
pretendo com certeza fazer a releitura, porque eu acredito que apenas uma
leitura não é suficiente para extrair desta obra maravilhosa tudo que o London
quis passar. E sim, este livro acrescentou algo em mim, fiquei muito feliz com a leitura e espero que outros livros das listas mexam comigo da mesma forma que este. Obrigado por ler até aqui e até a próxima!
“Tão peremptoriamente estes espíritos lhe
acenavam que a cada dia a humanidade e as pretensões humanas se afastavam para
mais longe dele. Das profundezas da floresta soava um chamado; e com a mesma
frequência que o escutava, misteriosamente emocionante e sedutor, sentia-se
compelido a virar as costas à fogueira e à terra batida a seu redor e
projetar-se para a floresta, correndo sempre em frente, não sabia para onde nem
por quê; e nem ao menos imaginava para onde ir ou por que iria, de tão
imperioso que era o chamado que vinha das profundezas das florestas (...)”